domingo, 23 de setembro de 2012

O Relachamento da Função Simbólica*

A incrível capacidade de produzir símbolos e imagens manifesta-se fortemente em inúmeras pessoas que tomam uma droga, ou passeiam pela literatura. Huxley, Watts, Leary, Dunlap, Newland e outros escreveram brilhantemente e às vezes eloquentemente sobre o assunto.
            O autor do presente artigo, na época em que tomou o LSD pela primeira vez, ficou atônito com a descoberta da fantástica fertilidade de sua própria imaginação e dos centros produtores de símbolos, sob o efeito da droga. Sentiu novamente a experiência do nascimento, viu-se transformado em personagens mitológicas, flutuou graciosamente através de belas cavernas de gelo reluzente e de magníficas catedrais góticas incrustadas de ouro; viu, com respeito, comporem-se e recomporem-se amostras de joias, numa variedade infinita de mandalas de formas vivas, maravilhas de incrível beleza modulando-se em infinitas variações de si mesmas, dissolvendo-se em galáxias revoluteantes de dimensões e significações infinitas, ou se transformando em formas livres maravilhosamente únicas, dançando com uma espontaneidade total em imprevisíveis construções plenamente extáticas. Houve principalmente a experiência da luz. Surgiu sob inúmeras formas: como um “centro de diamante” de brilho incrível (e, de certo modo, de uma significação incrível); como modelos de chamas vivas, superpondo-se numa espécie de equivalente visual da música, visível, apreendida diretamente pelo olho interior sob uma forma tridimensional, inflamando-se a partir de si mesma; e também como campos, bancos, muros, fortalezas, árvores e riachos cheios de rebentos e de pedras preciosas vivas.
            Somos aqui levados diretamente ao problema da intencionalidade. Este esplendor interno, evidentemente, não era, como diria Korzybski, extensivo (extensional). Não convinha a uma verificação ou a uma inspeção pública. Ninguém, a não ser o autor poderia confirmar a realidade do espetáculo. Esta realidade, no entanto, parecia indubitável; dava mesmo a impressão de uma realidade de ordem superior à realidade extensiva. Parecia também ter uma significação superior – ou antes, ser o próprio significado, não o símbolo de outra realidade, mas o próprio ato da simbolização; não precisamente “significando” qualquer coisa, mas significando o signo como tal.
            Kenneth Boulding disse que a possível proliferação, no homem, de imagens internas é ao mesmo tempo sua maior glória e seu maior azar. Isto lhe da ensejo de elaborar mapas que o fazem atravessar uma vida sensata, mas também os mapas mentirosos que o fazem perder-se na floresta. Em outras palavras, esta proliferação lhe permite tanto extensificar como intensificar. Extensificação e intensificação, o público e o particular vão de um a outro. Os fatos brutos (dados do universo) são caóticos e sem significação, até que uma espécie de estrutura lhes seja imposta; aí, então, adquirem senso e ordem. Esta estrutura nos serve de mapa, permitindo-nos atravessar a vida com uma compensação suficiente.
            A significação das coisas, entretanto, não reside nem nelas mesmas, nem totalmente em nós, mas antes num tráfico entre o interno e o externo – com uma preponderância particular do interno. Mais precisamente, as significações aparecem como descobertas, mas, de fato, são construções. Com o LSD 25, parece que entramos em confronto com esta parte de nosso ser interior onde o processo de estruturação opera em estado puro. É uma experiência fulminante. Aquele que a conheceu dificilmente a esquecerá; só pode avançar depois de ter visto, uma vez, sua própria intencionalidade numa forma isolada, estando mais apto a usá-la e a não se deixar iludir criando mapas para os quais não há território.

* Texto de Richard P. Marsh (livro 'Mandala - A Experiência Alucinógena')


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